terça-feira, 24 de maio de 2011

Tempo de aprender e o aprender com o tempo


Trago alguns pensares sobre a resinificação do tempo do aprender nos dias de hoje, nas instituições: escola e família, bem como o processo de aprender com o tempo.

Na minha prática psicopedagógica clínica em parceria com pais e escola, desenvolvo possibilidades de atuação dos seres pensantes no aprender na construção do conhecimento cientifico–cultural escolar e o conhecimento cotidiano familiar.
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Fernandez (2000) ao discutir sobre a aprendizagem de hoje e as modificações da construção do tempo, defende que “... havemos roubado o tempo, como diz Gonçalves da Cruz (1995) e Saidón (1995) junto a Deleuze, a Psicanálise é uma invenção do tempo para que o sujeito possa escutar-se e temos permitido que assim aconteça...“ (p. 244). Por analogia a autora assinala que a “... Psicopedagogia pode ser a produção de tempo para que possamos nos inventar pensantes” (p. 244).


Os instrumentos de comunicação da atualidade como a Internet, o celular, a televisão, fazem parte dos saberes do cotidiano advindo dos avanços do saberes científico culturais., constituem-se numa realidade. No entanto, a velocidade de imagens, de informações, de sons, por vezes afasta dos desafios reais do cotidiano. No meu modo de pensar, assistimos a uma aceleração da realidade, onde as relações humanas se distanciam de tal maneira que atingem a comunicação e, consequentemente de aprendizagem.

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Fernández (2000) ao analisar o papel da televisão na aprendizagem assinala, um ponto que concordo - o impacto da imagem visual tem tido mais força da verdade do que a palavra. A imagem da televisão parece preencher os anseios de quem a assiste. Mas a assinala que a palavra, sim é que permite um espaço para a pergunta, para o pensar e o aprender.

As modificações das construções do tempo advindas do mundo virtual de instantaneidade têm influenciado as relações de aprendizagem.

A escola e a família são atingidas pela “falta de tempo” para que seus alunos e filhos conversem, argumentem, discutam, enfim pensem. E com a “perda de tempo”, perdem o tempo para sentarem juntos e ouvirem histórias de seus antepassados familiares, ou ainda para ouvir e ver os alunos com problemas de aprendizagem.

O tempo na sociedade atual; do excesso de informação, da vertiginosidade e fugacidade das relações humanas, modifica a maneira da comunicação, da aprendizagem, e enfim do relacionamento humano.

Há então comportamentos comuns, todos têm pressa; de começar logo para terminar logo, de encerrar logo o dia para dormir logo, para acordar logo e ir enfrente logo. Mas para onde? Por que tanta urgência? A aprendizagem tem um certo tempo? E os problemas de aprendizagem têm um tempo certo duração? O atendimento psicopedagógico clínico deve atender às demandas de eficiência e eficácia do aprender? Os pais repensam o tempo dedicado ao ensinar e aprender de seus filhos? Qual seria a prioridade familiar, conversar ou ver televisão ou a Internet? Preparar os alunos para a competitividade do aprender ou para a cooperação do ensinar e aprender? Atender a dúvida do aluno ou pesquisar na Internet?


A aceleração temporal imposta pelas mudanças tecnológicas e sociais da pós-modernidade é vista por Fernandez (2001) ao discutir questões sobre as dificuldades da manutenção da atenção das crianças e jovens com problemas de aprendizagem, onde afirma que ”... a sociedade globalizada desatende a todos; contudo coloca como doença o que as crianças podem denunciar como a sua inquietude e falta de atenção” (p. 294).



Numa época onde o tempo individual é como que aniquilado pelo espaço cotidiano, o “aqui e o agora” adquire extrema importância devido ao ritmo imposto pelo tempo vivido na atualidade. Parece haver uma certa exigência de imediatismo de respostas, de resultados, sobretudo no processo de aprendizagem. O fracasso escolar, muitas vezes, filia-se ao fracasso familiar, e se faz urgente eliminar os seus efeitos, as notas e conceitos abaixo da media, sem ser considerado pelo ao menos as suas causas e implicações das diferenças, das particularidades de cada sujeito, de cada família e de cada escola.



Kehl (2009) ao apresentar colocações a respeito da depressão, ressalta que as novas gerações de jovens mães, filhas das mulheres fruto das mudanças e conquistas dos movimentos feministas do Ocidente são, como que afastadas da experiência da vivencia pratica da maternidade. Além desse fator ocorreu a entrada da mulher no mercado de trabalho. Perante essas mudanças o papel da mulher na família sofre transformações, e segundo Vaitsman ( 1994)., por vezes até mais flexíveis e plurais, novas famílias aparecem no cenário atual.



A idealização do filho acontece nesse cenário da competitividade do mercado. O filho sofre pressão familiar e por vezes escolar, acompanhado de uma agenda de atividades semelhante o do adulto, para ter sucesso. E desta forma com frequência, conflitos, perdas e dificuldades do processo de aprendizagem são atropelados pela aceleração do tempo de um outro, que o desconhece.



Os pais na visão de Kehl (2009), levam de maneira não avertida seus filhos ansiosos, tristes, hiperativos o até mal educados, ao psiquiatra. Não os auxiliá a enfrentar as repetências de ano, as dificuldades de aprendizagem, um insucesso no desempenho esportivo, ou até mesmo a impopularidade entre os amigos. Pontua que



São os pais, e não as crianças, que não suportam que seus filhos estejam expostos aos conflitos e crises inevitáveis da vida, assim como não toleram a ideia de que as vicissitudes da vida subjetiva possam deixá-los para trás na corrida precoce por boas colocações no futuro. Preferem medicar o sofrimento de seus filhos de modo à (re) ajustá-los rapidamente às exigências da vida escolar e dos ideais da vida social (p.278).



   Na observação clinica, vejo famílias insatisfeitas com o ideal construído por eles mesmos, sobre o aprender do filho e seu desempenho escolar. É muito baixo o tempo de tolerância aos ensaios de aprender, em geral esperam um resultado imediato e perfeito. Existe também, por parte dos pais a dificuldade perante as mudanças de comportamento da adolescência. Desta feita, os pais com certa insistência incentivam a continuidade da atitude infantilizada do jovem ou ainda não toleram esperar as crises de isolamento, típicas da construção da subjetividade do adolescer.



Concluindo acontecem poucos espaços para o sujeito ensaiar, treinar, aprender a perder e ganhar, ou ainda apenas a aprender no seu tempo e estilo.

A clínica psicopedagógica momento compartilhado entre terapeuta e cliente, é o espaço do “reconhecimento da falta”, do entrar em contato com a dificuldade para aprender, onde há um tempo de espera para que encontre a sua capacidade para aprender.



O sujeito com problema de aprendizagem necessita entrar em contato na clinica psicopedagógica, com sentimentos da espera para aprender, da falta do que sabe e do que não sabe, do tempo exigido para aquela atividade. Estes comportamentos são fundamentais para a destituição do sintoma e a transformação de um ser que escolhe, que pensa e aprende.


A possibilidade de escolher, de perguntar e de pensar , move a circulação do conhecimento na família e na escola. Essas são ideias defendidas na Psicopedagogia.



Referências bibliográficas

Fernandes  H. R. (Org.) Kehl, M. R., Mezan, R., Berlinck, M. C., Landa, F.& Costa, J. F. (1988) Tempo do desejo: Sociologia e Psicanálise (2nd.ed.). São Paulo, SP: Editora Brasiliense.

Fernández, A.  (2000) Psicopedagogia em Psicodrama: habilitando el jugar . Buenos Aires, Argentina: Ediciones Nova Visión.

Fernández, A. (2001) Os idiomas do aprendente: análise das modalidades ensinantes com famílias, escolas e meios de comunicação. Porto Alegre, RGS: Artmed Editora.

Kehl, M. R.  (2009) O tempo e o cão: a atualidade das depressões  São Paulo, SP: Boi tempo Editorial.

Vaistsman, J. (1994)  Flexíveis e plurais: identidade, casamento e família em circunstâncias pós-modernas Rio de Janeiro, RJ: Rocco.







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